04/08/2003

A familia dos outros

Aqui há uns anos atrás algum génio descobriu que o "quem sai aos seus não degenera" afinal não era só sabedoria popular. Justificava-se cientificamente pelos genes, acho eu. Não sei se foi o mesmo génio ou outro que depois provou a história do gene dominante. Lembro-me de falar nisto nas aulas de Biologia por causa da cor dos olhos de cada um, mas que se aplica a muito mais que tão insignificante pormenor. O funcionamento do cérebro, esse misterioso orgão, também se explica muitas vezes pela hereditariedade.
E é nas crianças que isto mais facilmente se percebe. O "sais mesmo ao pai/à mãe" é algo que todos nós ouvimos milhentas vezes. Nós só tomamos consciência dessas semelhanças em adultos, mas os outros topam-nas em nós em miudos. Mas quando somos miudos e nos apresentam esse facto como um fatalismo, o que nos acontece é atormentarmo-nos constantemente com isso, ou justificarmos tudo o que nos interessa com esse facto. O que nem sempre é vantajoso.
Em minha casa misturam-se quatro familias. Aliás, até se misturam mais, mas predominam quatro. Tantas quantos os que somos. Tal como no Pedro predominou o gene do pai, no Arturito predominou o gene da mãe. Se eu consegui lidar com o Ernesto tanto tempo, agora é relativamente fácil lidar com o filho dele (ok, que também é meu e isso ajuda mesmo muito...). Mas já a mãe do Arturito é uma história completamente diferente. E o puto sai-lhe a ela, exactamente naquelas coisas que me fazem sair do sério. O egocentrismo, a autocomiseração, a mania da perseguição e a eterna ausência de responsabilidade desestabilizam-me. Se somarmos isto ao que o gene do pai deu ao miudo, que foi o silêncio como forma de ultrapassar os problemas, o que temos é um miudo que guarda ressentimentos, que constantemente relembra o pior de cada situação, que não aceita uma crítica, que não se dá, que entra em confrontos com os outros facilmente e que nem perante si mesmo se sente bem com o que é. Junta-se isto a uma educação deficiente, por muitos e variados motivos que um dia perceberão, e o resultado é uma criança com a qual tenho extrema dificuldade em lidar. Desde que o meu filho nasceu que tenho tentado usar a inteligência para ultrapassar as dificuldades de comunicação e educação. Nem sempre o cansaço de um dia de trabalho ajuda, nem sempre a minha inteligência ultrapassa a dele, mas pelo menos relacionamo-nos. O Arturito, em determinada altura, construiu um muro entre nós e não há inteligência que me valha. Nem a mim, nem a ele.
Sempre disse que gente "burra" me irritava. O puto é esperto, generoso com os desfavorecidos, tem uma capacidade inata para o desporto, mas, que me perdoe o pai por o dizer, de inteligente tem muito pouco. E o meu gene predominante, infelizmente, não se dá bem com gente assim. Vou ter agora algum tempo para forçar o meu outro gene a trabalhar, e ver se assim consigo que o próximo ano lectivo seja proveitoso para todos.
Sugestões e ajuda, aceitam-se...