29/08/2003

Apetites

Não tenho grande fome e a Maria Papoila, minha companhia habitual para almoço, hoje não pode almoçar comigo. Stress pré-férias. E eu, que tenho a cabeça às voltas, prefiro ficar aqui a escrever que sair para a rua, apesar de ter no carro um livro que ando a demorar muito mais que o costume a ler...
A mãe do Arturito ontem, de calos apertados pela visita das senhoras da Comissão de Protecção, decidiu que se calhar era melhor falar com o Artur. Reconheceu e admitiu que o filho está mal educado, que lhe faz todas as vontades, que lhe deu uns sopapos mas nada mais. Continuo a ser o seu ódio de estimação, e na cabeça dela tudo o que sucedeu nestes dias foi culpa do Artur. Este facto foi assimilado pelo miudo, que pretendia esclarecer com o pai o porquê do sucedido. Alguma coisa aconteceu, mas parece-me que o miudo prefere uma cena de pancadaria de vez em quando a educação todos os dias. É normal.
O Artur deve ter pensado que agora as coisas melhoram. Eu pensei em ir de imediato pedir ao Tribunal a revisão da regulação do poder paternal. E em arranjar forma de despachar o divórcio. Tudo em prol de melhorar a qualidade de vida da nossa familia e de afastar o mais possível aquela senhora.
Mais uma vez, hoje, ele não recebeu ordenado. Pensei seriamente que, pelo volume de trabalho que a empresa tem tido, que hoje haveria dinheiro para regularizar a situação, se não totalmente, pelo menos de forma mais agradável do que os € 280 que lhe vão dar, e que mal chega para as despesas todas da casa que temos obrigatoriamente de pagar na próxima semana.
Felizmente a despensa está meio cheia e há comida para o Joaquim...

Créditos

Que estranho achava eu o aumento substancial, na ultima semana, de visitas ao meu humilde blog!... Pensei, pensei, e achei a solução: há links pra isto nos "Ovos Estrelados" e n' "O Marronco" (ver links pra lá aqui ao lado, que sempre se torna mais fácil assim, para mim, ir lá ver de vez em quando o que eles dizem).
Explicado o mistério, cumpre-me agradecer à Maria Papoila e ao Marronco este boom, tendo eles apadrinhado umas quantas incautas espreitadelas a tal novela. Se lhes têm agradecido ou não, não sei. Mas a culpa não foi minha ;)

História paralela

Nas novelas há sempre os personagens laterais, os escapes cómicos, essas coisas todas. Na minha novela também.
Ontem entrou na nossa vida o Joaquim. O Joaquim é uma oranda tricolor, com uma mancha que se assemelha a um bigode. Para os distraidos, o Joaquim é um peixe. Depois da morte da Joana, um cometa albino a quem só faltava falar comigo, fiz dois meses de luto, até que a presença do aquário vazio começou a entristecer-me mais que a lembrança de uma "peixa" fora do comum. O Joaquim ainda sofre do stress da mudança, ainda não interage comigo, mas para tudo na vida é preciso tempo e paciência. Quando os miudos forem maiores e derem menos trabalho, hei-de ter um daqueles aquários de água quente, com muitos peixinhos de muitas cores.
É que, na minha novela, há dias que me apetecia viver imersa em água, afastada do mundo do ar em que os sons nos ferem os tímpanos e em que nada parece empurrar-nos para cima...

28/08/2003

De volta

Ontem cheguei a casa cedo. Ia gastar o meu fim de tarde a jogar Playstation com o Pedro, mas ele fez birra no café e por isso perdeu a "medalha de bom comportamento". Entrámos em casa, sentámo-nos na cama dele e calmamente expliquei-lhe porque é que iamos ter de encontrar outra actividade para os dois.
Tocou o telefone:
"Boa tarde, minha senhora, é de casa do Sr.Artur, pai do Arturito? Daqui fala da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Sintra, e estou a ligar para saber se o menino está convosco ou com a mãe. É que recebemos uma denuncia anónima, no dia 14 de Agosto, de que o menino teria sido agredido pela mãe. A pessoa que fez a denuncia disse que o menino passava fins-de-semana e férias com a mãe e que nesses dias havia sempre confusões, mas que desta vez a coisa foi de tal ordem que alguém chamou inclusivamente a GNR, que quando chegou não encontrou ninguém. Como estivémos de férias, vamos apenas agora proceder às averiguações necessárias..."
Ah, não sabiam? É. A minha vida é mesmo uma novela, e voltámos aos episódios trágicos. O Artur diz que não acredita que tenha sido algo muito grave. Mas ninguém faz uma denuncia desta gravidade por uma ninharia. E ninguém faz uma denuncia deste género que envolva um menino meu e eu fico descansada. Engraçado é as nossas autoridades acharem que podem ir de férias, ou que durante o mês de Agosto as crianças e jovens de Portugal não sofrem maus tratos.
Como eles dizem na televisão: não perca os próximos capítulos...

27/08/2003

Quando fomos para a cama, em vez de nos deixarmos deslizar para o sono, ainda estivémos com tolices sobre datas. E já passava das três da manhã, que a conversa tinha sido longa.
O despertador tocou, como de costume, às 6:45. E a mim custou-me a sair da cama, não pelo sono, mas por me sentir inchada, enorme. Acordei prenhe de calma e esperança de que tudo vai mesmo melhorar, e sair de perto do corpo dele, hoje, era algo que não me apetecia.
Devia poder justificar-se faltas ao emprego pelo cansaço que às vezes nos dá lutar por aquilo e aqueles que amamos, por um dia de felicidade que depois desperdiçamos longe de quem realmente interessa.

26/08/2003

Três anos

Não foi por acidente, mas conhecemo-nos na velha rotunda do Centro Sul. Depois de alguns meses de troca de mensagens no Odigo, conheci o Artur. Íamos dois casais jantar a Sesimbra, mas das quatro pessoas presentes apenas ele não tinha acabado de comer quando nos encontrámos, por isso ficámos pela sapateira - ele comia, os outros faziam de conta... Por minha causa ele gastou/estragou (o mistério continua!) um isqueiro que tinha trazido de New York no principio do ano. Fomos ao Bujix depois do jantar. Depois fomos para casa.
No dia seguinte, ao fim da tarde, liguei-me à net e tinha uma mensagem: "Não sei porquê, mas não dormi nada e não consegui parar de pensar em ti."
É como na missa: em verdade, em verdade vos digo, que faz hoje três anos que ele entrou na minha vida, algo que espero que seja até que a morte nos separe. Vão em paz. ;o)

25/08/2003

Parabéns e obrigado

Pois, de manhã esqueci-me.
Parabéns à Maria Papoila pelos seus Ovos Estrelados.
Obrigado ao Artur que me livrou da praga das traças na despensa.
E este dia que nunca mais acaba...

Treze dias depois

Adoro passar o mês de Agosto em Lisboa. O trânsito é menos complicado e há lugar para estacionar, por isso trago o carro. Nos cafés e restaurantes há lugar para sentar, os poucos que pela metrópole ficam têm menos pressa, e há já duas semanas que ninguém me acotovela no quiosque. Pena é que passar o mês de Agosto em Lisboa signifique ter férias em Julho ou Setembro, e, por consequência, ter de trabalhar quando os outros descansam. Não por os outros descansarem, que eu não sou de invejas. O mau disto é que quem fica a trabalhar tem o triplo das tarefas a desempenhar, metade da experiência para o fazer, e dez vezes menos vontade. Trabalho numa área em que dependo da qualidade do serviço alheio para que o meu corra bem. Quando todos os outros que estão a trabalhar sofrem do sindroma laboral de Agosto, tudo chega em mau estado à minha secretária. É impossível conseguir organizar-me quando à minha volta impera o caos dos papéis trocados, dos telefonemas urgentes, dos directores indecisos. Por isso passaram treze dias desde o ultimo post. Mil desculpas a quem por aqui se perdeu e deu com um jornal bom para embrulhar castanhas, que é para o que servem aqueles que já lemos na integra.
O fim de semana do 15 de Agosto foi deveras agradável. Descobri um hotel novo em Reguengos de Monsaraz que fez as minhas delicias. Chama-se Hotel Provincia. Para quem gosta do petisco alentejano, de calma e de simpatia, num ambiente mesmo muito agradável, sente-se lá como eu me senti: em casa. Também pela primeira vez na vida fui à Ericeira. O hotel Vila Galé é o oposto do Provincia, e quero ver se lá não volto. Mas a vila é simpática, parecia que tinha voltado às férias na Nazaré, adolescente e com a mana mais velha.
No dia 19 o Pedro fez anos. Foi um bom dia. Ontem fomos a casa da Tia Guida, que fez 60 anitos com muita esperança em fazer ainda mais, mas que os resultados visiveis da quimioterapia pareciam minorar. Hoje voltei ao trabalho. Estou com cara e disposição de segunda-feira, que se agravam por ter dado um mau jeito ao ombro esquerdo.
E por não saber que volta dar à minha vida, naquela parte que diz respeito à relação do casal no qual a familia se centra.

12/08/2003

A mão

Há coisas que nos acontecem que, pela sua singularidade, obrigam a que as divulguemos. Por falta de melhor meio, aqui fica a melhor do dia de hoje, para os meus milhares de leitores.
Trabalho com documentos cuja importância faz merecer alguns cuidados com a sua entrega seja a quem for. Dessa forma, hoje, quando um colega aqui veio levantar alguns desses documentos, pedi-lhe, como é hábito, que assinasse a cópia da comunicação de envio, com a menção de os que tinha vindo buscar pessoalmente. O colega assim fez, eu entreguei os documentos e despedimo-nos cordialmente.
Quando o colega saiu peguei na cópia que ele assinara para a arquivar. Na mesma, pelo seu punho, constava orgulhosamente:
"Levantei a mão em 12/08/2003."

Atchim!

Já não bastava ter partido um dente, facto que deu origem a mais umas peregrinações ao suplicio que representa a cadeira do dentista, consegui constipar-me. Este calor infernal leva-nos a cometer todo o tipo de idiotices em troca de uns segundos de frescura: dormir com todas as janelas de casa abertas, para aproveitar as correntes de brisa (não é engano: não são dignas do titulo de correntes de ar); tomar banho de água tépida e não secar o corpo imediatamente antes de nos espojarmos nus em cima da cama; deitarmo-nos em chão de mosaico e deixar a ventoinha no máximo enquanto vemos televisão... Isto sem falar no ar condicionado que abençoamos no local de trabalho, mas que provoca mudanças de temperatura de dois em dois metros.
Graças a tudo isto, dói-me a garganta, tenho tosse, o nariz pinga incessantemente e só me apetece é dormir.

11/08/2003

Preguiça

Um dos pecados capitais. Basta ter visto o "Se7en" para saber isto, não é preciso ter ido à catequese. Lá por casa, este fim de semana, podiamos os dois ser condenados às chamas do inferno. Demasiado calor para sair, demasiado calor para nos mexermos mais que o absolutamente indispensável. Ok, ainda fomos beber café e comprar um gelado, e ainda saimos para comer umas deliciosas ameijoas no "Katekero", tasca fenomenal para o bom apreciador de petiscos. Ao fim da tarde, em ambas as ocasiões, claro.
Os miudos continuam com os outros progenitores, temos mais uma semana de folga. Na próxima terça-feira acaba-se, no dia de anos do Pedro. Já tou cheia de saudades dele, essa é que é essa... No trabalho parece que consegui finalmente organizar-me, o que alivia substancialmente o stress.
Ironias... Falei agora com a minha mãe: "A minha relação com a tua avó é cada vez pior, nada do que eu faço está bem feito, irrita-se com tudo o que eu digo..." É dos genes. É da hereditariedade. É sei lá o quê que fez e faz com que toda a vida a minha mãe procure aprovação por parte da mãe dela, e que eu procure a da minha mãe. E o pior é que ela nunca vem. O Artur diz que é por isso que eu me vanglorio de tudo o que faço. Não sei se ele tem razão ou não. E não vou perder muito tempo a pensar nisso.
Não me apetece escrever. Acabou-se-me o tabaco e o melhor é ir desligando isto que hoje saio cedo.

08/08/2003

Sexta-feira!

Finalmente, a hora de sair aproxima-se. O Artur já aí vem, eu já mal consigo pensar e o meu maior sonho é chegar a casa, tomar banho e dormir até mais não querer. Não quero saber do mundo até amanhã.
Eu sei que foi um final de semana pautado pela minha ausência, mas era ou blog ou cinema, e ontem foi cinema. Amanhã, depois, na segunda, eu volto cá.
Bom fim de semana para... ora, para quem aqui parar, mesmo sem querer.

06/08/2003

Faltas de juizo

Há uns meses atrás, e por força do acontecido no ultimo ano, a mãe do Arturito deixou de falar, pessoalmente ou pelo telefone, com o Artur.
Ontem saí do trabalho às 19:50h, irritadissima com a falta de organização instalada por um colega nos arquivos de uma nova tarefa que me atribuiram para desempenhar durante as férias do dito.
Ontem ouvi o Artur dizer ao filhote para informar a mãe que o deveria ir buscar hoje às 19h, e percebi que o miudo já tinha dito à mãe que era às 7h.
Ontem disse ao Artur que era melhor informar a mãe do Arturito via advogados, e a resposta foi "bah, tanto trabalho!".
Ontem, fui-me deitar com uma grande dor de cabeça, e demasiado tarde.
Hoje, às 6:59h a mãe do Arturito tocou à campainha da porta de minha casa. Pela ausência de resposta, lá atendeu o telefone e lá ouviu o Artur dizer "pois, se falasses comigo estas coisas não aconteciam, volta dentro de 12 horas".
Hoje vim trabalhar quando devia ter ficado na cama.

05/08/2003

Queijo e azeitonas

Quando decidi que era altura para o fazer, comprei uma casinha pequenina. Era o 1.º andar, letra D, de um prédio com muitos anos. Há quase tantos anos quantos o prédio tinha, morava no 1.º andar, letra C, a familia Lopes, de origens alentejanas. Zé, pai, trabalhador dos SMAS da zona; Tita, mãe, doméstica e Sandra, filha, professora primária. Traços fundamentais da familia Lopes: o pai é um homem de grande educação, de coração enorme, sem paciência para quem não presta e que adora petiscos e copos, em volta dos quais suspira(va!) pelo desejo de ter um neto; a mãe está em casa para cuidar da familia (a mãe dela, acamada há alguns anos, também integra o agregado familiar, mas por efeitos de um AVC grave mal fala sequer), dedica-se de forma quase cientifica à arte da coscuvilhice, falta-lhe o bom fundo que o pai tem sem deixar de ser generosa (numa perspectiva "toma o chouriço, que depois me darás o porco") e suspira(va!) por um neto; quanto à filha, mimada em excesso toda a vida, passa o tempo entre a escola e a casa, não escolhe da melhor forma as companhias e por isso tem inumeras desilusões nos seus relacionamentos, nenhum dos quais envolvendo riscos de a tornar mulher autónoma e com vida própria, porque isso ia dar muito trabalho, coisa que em casa não tem porque a mãe não deixa, não lhe passando pela cabeça alguma vez dar um neto aos pais.
Acolheram-me de braços abertos ao prédio. O Zé encontrou em mim aquilo que gostaria de ver na filha e foi amor à primeira vista. A mãe alinhou pela fonte de novas informações que eu era. A filha porque achou que eu ainda podia passar pelo papel de sua irmã mais velha e porque eu tinha histórias de amores para partilhar, escusando ela de as viver.
Quando engravidei, toda a familia rejubilou. Eu estava sózinha, precisava de apoio, eles já me tinham acolhido na familia e o sonho dos pais tornava-se realidade: o mais parecido com um neto que teriam na vida vinha a caminho!!!
O Pedro nasceu a 19 de Agosto. E nasceu com problemas de saúde. Esteve internado três semanas no Hospital da Estefânia antes de ir para casa. Gozei a licença de parto entre a casa e o hospital. A familia Lopes foi vivendo todas as angustias, todos os sobressaltos, todas as alegrias dos dias bons comigo. Quando tudo estabilizou, quando voltei ao trabalho, todos eles sabiam bem como lidar com o Pedro, como tratá-lo. A paciência deles foi infinita para o alimentar, que ele aos quatro meses deixou de gostar de comer; para o aliviar das dificuldades respiratórias, que ele andou dois anos fora e dentro da fisioterapia; para lhe acalmar o choro e recolher a hérnia à qual foi operado com cinco meses. Fui "proibida" de procurar uma ama, a Tita ficou com ele. Há coisas que nunca se conseguem "pagar" na vida, e essa é a minha maior dívida - o poder sair para trabalhar apenas com medo de o deixar, mas sem pânico, por saber que o Pedro estava com quem o conhecia, o amava e dele sabia cuidar.
Dois anos depois a Tita cansou-se e o Pedro foi para uma creche familiar, gerida pela mesma instituição onde agora frequenta o infantário. A família Lopes faz parte das nossas vidas, são mais um ramo da nossa própria familia. São visita obrigatória sempre que possível, vão buscar o Pedro frequentemente ao infantário, ficam com ele sempre que eu quero ou preciso ou apenas pelo prazer que o Pedro tem de lá ficar, a dormir de sexta para sábado e a recarregar a bateria do mimo.
Como estou a trabalhar, ficará para outra ocasião o menos bom desta história. Até porque hoje me custa lembrá-lo, que ainda tenho água na boca do queijo e das azeitonas que me trouxeram do Alentejo que no domingo visitaram, por lhes ser impossível lá irem e não me trazerem a mim também um mimo. Mesmo quando o Pedro está de férias com o pai, e por isso chamarem-me à sua casa para me entregar tais vitualhas não é apenas um pretexto para verem o sol das suas vidas.

04/08/2003

Disse Isabel, no Mães (e pais também)

"ouvi um dia o pedopsiquiatra Pedro Strech, dizer que há uma grande diferença entre gostar e cuidar de um filho. para cuidar, o nível de exigência física e mental, de organização da vida do dia a dia, de planeamento é enorme.
e eu digo por experiência própria, que muitas vezes, é desgastante, cansativo e que às vezes até desanimo um bocadinho..."

Mas podia tê-lo dito eu. Ou não? Já disse, foi?...

Não estou só!!!

Não é possível explicar certas coisas. Tinha estado a ler o blog DesejoCasar, onde li alguns posts lindos, e onde alguém lembrou a solidão que se vê nas nossas ruas, cada vez mais. Lá pelo meio, surgiu um link: Mães (e pais também) maes.blogspot.com.
A alegria, senhores, que senti! Há mais, como eu, que entendem que o sono das mães é tão sagrado como o dos filhos, há mães que se escrevem na net (ver o meu primeiro post!), há mais quem, como eu, viva no meio de preocupações mundialmente comezinhas mas que são o nosso mundo.
Abençoadas, que me fizeram marejar os olhos como se me tivessem abraçado e murmurado ao ouvido "eu compreendo-te..."

Ressalva

Fiquei a matutar no meu post anterior. É que esqueci-me de dizer algo que me parece de alguma relevância para o assunto.
Eu gosto do Arturito. Independentemente de tudo o resto, eu gosto do miudo. Ele faz parte da minha familia, ou é assim que eu o sinto, e se o faz foi porque eu também o quis. Não é possível amar-lhe o pai e não gostar dele.
E, como eu lhe digo vezes sem conta, só se não gostasse dele é que não me preocupava com ele, com a nossa relação e com a vida em comum daqueles que partilham a nossa humilde casinha, que só por acaso é a primeira lá do prédio, a contar vindo do céu... Mas, continuando com as referências musicais, what's love gotta do with it?...

A familia dos outros

Aqui há uns anos atrás algum génio descobriu que o "quem sai aos seus não degenera" afinal não era só sabedoria popular. Justificava-se cientificamente pelos genes, acho eu. Não sei se foi o mesmo génio ou outro que depois provou a história do gene dominante. Lembro-me de falar nisto nas aulas de Biologia por causa da cor dos olhos de cada um, mas que se aplica a muito mais que tão insignificante pormenor. O funcionamento do cérebro, esse misterioso orgão, também se explica muitas vezes pela hereditariedade.
E é nas crianças que isto mais facilmente se percebe. O "sais mesmo ao pai/à mãe" é algo que todos nós ouvimos milhentas vezes. Nós só tomamos consciência dessas semelhanças em adultos, mas os outros topam-nas em nós em miudos. Mas quando somos miudos e nos apresentam esse facto como um fatalismo, o que nos acontece é atormentarmo-nos constantemente com isso, ou justificarmos tudo o que nos interessa com esse facto. O que nem sempre é vantajoso.
Em minha casa misturam-se quatro familias. Aliás, até se misturam mais, mas predominam quatro. Tantas quantos os que somos. Tal como no Pedro predominou o gene do pai, no Arturito predominou o gene da mãe. Se eu consegui lidar com o Ernesto tanto tempo, agora é relativamente fácil lidar com o filho dele (ok, que também é meu e isso ajuda mesmo muito...). Mas já a mãe do Arturito é uma história completamente diferente. E o puto sai-lhe a ela, exactamente naquelas coisas que me fazem sair do sério. O egocentrismo, a autocomiseração, a mania da perseguição e a eterna ausência de responsabilidade desestabilizam-me. Se somarmos isto ao que o gene do pai deu ao miudo, que foi o silêncio como forma de ultrapassar os problemas, o que temos é um miudo que guarda ressentimentos, que constantemente relembra o pior de cada situação, que não aceita uma crítica, que não se dá, que entra em confrontos com os outros facilmente e que nem perante si mesmo se sente bem com o que é. Junta-se isto a uma educação deficiente, por muitos e variados motivos que um dia perceberão, e o resultado é uma criança com a qual tenho extrema dificuldade em lidar. Desde que o meu filho nasceu que tenho tentado usar a inteligência para ultrapassar as dificuldades de comunicação e educação. Nem sempre o cansaço de um dia de trabalho ajuda, nem sempre a minha inteligência ultrapassa a dele, mas pelo menos relacionamo-nos. O Arturito, em determinada altura, construiu um muro entre nós e não há inteligência que me valha. Nem a mim, nem a ele.
Sempre disse que gente "burra" me irritava. O puto é esperto, generoso com os desfavorecidos, tem uma capacidade inata para o desporto, mas, que me perdoe o pai por o dizer, de inteligente tem muito pouco. E o meu gene predominante, infelizmente, não se dá bem com gente assim. Vou ter agora algum tempo para forçar o meu outro gene a trabalhar, e ver se assim consigo que o próximo ano lectivo seja proveitoso para todos.
Sugestões e ajuda, aceitam-se...

01/08/2003

À espera

Isto há dias que correm bem como tudo. Não bastava estar à espera que o Artur me venha buscar, como ainda estou a ouvir confissões da vida de um colega que dava o ordenado de um mês para não ouvir. Com pormenores íntimos! Para além disso, dói-me a cabeça. E ela mentia-lhe, vejam lá só, sobre a idade que tinha!
Há muita gente que mente, é verdade, mas temos tendência a não o comentar com ninguém, principalmente quando quem nos mente é alguém de quem gostamos muito. Por mais inofensiva que a mentira seja, quando a apanhamos sentimo-nos magoados, e não conseguimos evitar pensar que o gostar muito tem apenas um sentido. É uma gaita, porque vamos amargando e deixando de sentir a antiga cumplicidade do sem segredo e sem rodeios. E começamos a pensar se devemos abrir-nos tanto com essa pessoa como faziamos. E ficamos com todos os sentidos apurados à espera da próxima, e isso, isso é o pior. É o ouvir tudo com muita atenção, o registar tudo o que é dito, o comparar as palavras de hoje com as de ontem, o que diz agora com o que disse há meia hora, o procurar contradições na mesma frase...
Depois começa-se a preferir o silêncio, que quando estamos calados não corremos o risco de ouvir ou dizer o que não se quer, e nesse silêncio fica a ânsia de que tudo volte a ser como era, de que o medo de nos termos partilhado em vão nos abandone.
Bom fim de semana.

Hot, hot, hot...

Fui almoçar com a Maria. Está tanto calor que nem assunto para falar tinhamos. Parecia que a lingua se colava ao céu da boca, e que até o esforço de mastigar era sobrehumano. Quem habitualmente nos vê, ao almoço, sabe que parece sempre que não nos vemos há meses e temos muita conversa para por em dia. Hoje deixámo-nos derreter na mesa do sítio do costume. 40º em Lisboa. Céus!...
Ontem apanhei um bocado das notícias da noite na televisão. Imaginar a minha casa perto de um dos locais em chamas de Portugal, em que Vila de Rei é o pior caso do ano (ter um incêndio no perímetro urbano de uma localidade e os bombeiros ficarem sem água é atroz) deixou-me com um nó na garganta.
Por mais esforço que faça, nada me ocorre que não esteja de alguma forma relacionado com a temperatura do ar.
Excepto a tentativa de comprar roupa à hora de almoço. Talvez o azar tenha sido o ter entrado numa loja de roupa para raparigas com anorexia ou bulimia. Nem o meu número, orgulhosamente exposto numa prateleira, me servia! É que nem nas ancas passava, sequer! A t-shirt que tentei enfiar fez-me sentir muito inteligente: era um XL mas nem pela cabeça consegui que passasse. A minha caixa craniana, portanto, é muito grande mesmo, o que se torna necessário para albergar convenientemente todas as minhas células cinzentas.
O calor dilata os corpos, não as cabeças. E muito menos as roupas.

Pensar

É complicado, às vezes, escrever o que se quer. A maior parte do que escrevo começa por ser “isto” e acaba “aquilo” sem eu fazer ideia de como tal aconteceu. A forma como penso assemelha-se muitas vezes ao fumo dos meus cigarros... Dá-se a primeira passa no primeiro cigarro do dia: é uma nova ideia cheia de vigor, um pensamento prenhe de potencial. Depois expele-se o fumo. Outra passa e aquela ideia, aquele pensamento já passaram, esvairam-se no ar e nunca mais consigo reencontrá-los da mesma forma, com a mesma alegria, porque já não são novos, apenas a lembrança do que já tinha sido. Os outros cigarros já são só a continuação do primeiro, nunca sabem ao mesmo.
Há uns anos atrás, gabava sem modéstia a minha memória. A vida corria devagar e o registo dos dados era feito de forma regular e certinha. Agora não. A minha mãe costumava perguntar “Pensas que a minha cabeça chega a todo o lado?”, sempre em tom acusatório e cansado e eu não compreendia. Já perdi a conta às vezes em que o pensei. Os últimos dois anos esgotaram-me. Foi informação a mais, foram problemas de mais para assimilar e ultrapassar tudo sem mazelas. E agora sinto-me no limite e não sei que fazer.
E o pior é que a culpa não é de ninguém e é de todos. É a minha responsabilidade, à qual nunca fujo, que desta vez não consigo delimitar. São as minhas acções e omissões que já não sei escolher com a calma e ponderação que me são indispensáveis para não me arrepender de nada depois. É o cansaço dos primeiros, segundos e ultimos passos de tudo que tenho sempre que dar. E é sentir-me de pés atados sempre que quero andar.
Talvez seja por isso que procuro sapatos para mim há mais de dois meses e não encontro nenhuns que me agradem.